Quantas vezes pensamos nisto… atravessar o Mediterrâneo e chegar numa das portas de entradas do mundo muçulmano. Pois bem… chegou a hora. O Comandante conferiu a previsão do tempo e viu que não faríamos nenhuma das três opções iniciais (post anterior) e que daqui de Siracusa faríamos uma pernada só até Monastir.
Quarta-feira (20) zarpamos após o café da manhã, pouco antes das 9 horas. A previsão era de saída com vento de 20 a 25 knots e chegada com pouco vento, mas o que encontramos o tempo todo da travessia foi vento de proa e mar agitado com ondas desencontradas.
Assim caturramos muito, e quando trocávamos de turno me sentia ainda no embalo do sobe e desce e das estancadas duras quando a Pharea descia alcançando o mar lá em baixo.
A Bella ficou bastante assustada com o barulho das ondas sob o casco… quando ela estava no cockpit usou colete salva vidas e nós também inauguramos nossos coletes auto-infláveis, que aliás adoramos… leve, fácil de ajustar, de vestir e com opções de tamanho da fita de segurança para prender na linha da vida. Como tivemos chuvas fortes nos dias anteriores o mar estava com muitas algas e tocos de madeira boiando… depois que contornamos a pontinha da bota da Itália 🇮🇹 o Renato sentiu o leme pesado, estávamos próximos a Porto Palo e ele decidiu parar e mergulhar para ver o que havia com o leme ou se algo estava preso no hélice.
Não estava quente e acho que a água a uns 18 graus, felizmente ainda havia sol… tirou a touca, o casaco, as botas e vestiu sua roupa de neoprene e mergulhou… achou um pedaço de cabo no hélice, pôde conferir tudo pois a água estava bem clara. Retornou tomou uma ducha na popa brrrrrr brrrr…. estava bem frio lá fora e com vento gelado… minutos depois retornamos nossa jornada. Realmente, acredite, não é nada fácil ser o capitão 👨✈️. Muitas ondas levantavam o spray de água nos molhando mas, em contra-partida, as visões fantásticas do nascer e do por do sol e da lua…
além de um céu magnífico com as estrelas do Norte e as estrelas cadentes. Na primeira noite durante meu turno olhei para a esteira de água e lá longe vi um navio todo iluminado, dourado… achei bem estranho…não eram luzes brancas como os demais navios e sim dourado de ponta a ponta… fiquei olhando sem entender exatamente… alguns minutos depois descobri que na verdade não era um navio e sim a lua minguante que nascia e suas duas pontinhas davam a impressão de ser a popa e a proa de um navio… navio sim porque era bem grande kkk.
Depois que deixamos de ver as luzes do continente europeu, o próximo clarão que vimos foi da Ilha de Malta 🇲🇹, que ficou por bombordo, depois da Ilha Di Linosa (que poderia ser um local de parada se precisássemos) e da Ilha Panteleria… mas passamos ao largo e não chegamos a ver terra. Dois dias de mar agitado, ondas desencontradas, ventos constantes entre 15 e 25 knots… na manhã do terceiro dia já começamos a avistar o continente… uma emoção surgiu e tivemos a certeza de que tudo é possível… daqui a pouco chegaremos na África. Não na África dos elefantes e dos inúmeros animais que permeavam a imaginação de quanto éramos crianças mas a África do deserto, dos oásis e dos beduínos, o norte da África.
Nos aproximamos e o Renato chamou a Marina Cap Monastir pelo rádio e não obteve retorno, insistiu a medida que nos aproximávamos mas ninguém respondeu… o Renato passou o canal de entrada da marina e não identificamos ninguém… até que vimos um senhor abanando e nos orientando onde atracar em 35°46.786’N – 10°50.006’E, sim havíamos chegado, após 49 horas de navegação e de 256 milhas náuticas, mesmo cansados… muito felizes por esta travessia que há muito esperávamos. Namastê 🙏🏼
1250 dias, 20 a 22 de novembro de 2019, chegando no norte da África, Monastir.